A SOMBRA FANTASMA
Conto Francisco Piccirilo
Luis Antônio era um caixeiro, que desde menino trabalhou para seu Mané da Venda. Manuel Carvalho, português da Ilha da Madeira, fazia anos que estava no Brasil. Veio para cá e montou um armazém de secos e molhados; fazenda e armarinhos, além de outras mercadorias, bem na saída da pequena cidade. Ali constitui ponto obrigatório de parada não só de tropeiros, boiadeiros, vianjantes, como também do povo de um vilarejo distante vinte e cinco quilômetros, que vinha fazer compras. Distante cem metros começava o mato que se prolongava a perder de vista. A própria vilinha de São Luis, que por perto havia pequenas roças, culturas de café, um pouco de aves e alguns animais, ficava rodeada pelo matagal.
Visto como a venda do seu Manuel era ponto de parada dos mais variados tipos de gente, muitas coisas eram contadas de arrepiar cabelos, porém, todos afirmavam que entre Cravolândia e o povoado de São Luis, havia um trecho assombrado. Homem algum por mais valente que fosse conseguia atravessar. Esse complexo de medo fazia com que ninguém se atrevesse a transitar pela estrada de noite, sobretudo quando enluarada.
De São Luís ninguém vinha; para lá não havia necessidade de irem. Com isso a estrada conservava-se isolada e misteriosa. Isso durou muitos anos até que um dia…!
Um dia surgiu uma era em Cravolândia. O progresso chegara ali e inclusive para o lugarejo. Uma grande indústria se instalou na cidade. Começou o aparecimento de vilas pelos quatro cantos do lugar; a própria venda de seu Mané já não ficava mais na saída e sim quase no centro. O mato fora afastado além de quinhentos metros; o movimento de tropas e boiada transferido para outro setor. O progresso de São Luis aumentou, passou a vila e agora já era uma pequena cidade, porém, a estrada continuava meio misteriosa, porque, agora poucos falavam de assombração. Alguns anos depois ninguém mais se lembrava de nada. Luis Antônio até esquecera daquilo que os caboclos tanto contavam; o armazém tinha aumentado; novos fregueses; novas caras; tudo enfim contribuía para o completo abandono da falada “alma do outro mundo”, que tanto amedrontava os cavaleiros.
Passados muitos anos e quando o caixeiro já era moço, foi deixada por um viajante no armazém, uma carta urgente endereçada ao senhor Osório Jacinto, da vila de São Luis. Eram duas horas da tarde de um domingo. Manuel Carvalho, que era homem muito atencioso e fazia tudo para servir os amigos, vizinhos e fregueses, estava encabulado com aquela carta. Como iria fazê-la chegar ao destinatário? Luis Antônio, a fim de tranquilizá-lo, prontificou-se em levar a correspondência. Selou o cavalo em poucos minutos estava a caminho de São Luis. A Vila nesse dia esta bonita, chela de gente; rapazes e moças; algumas mais bonitas que outras irradiavam beleza e mocidade. Havia festa em louvor ao Santo Padroeiro. Procissão, banda de música, rojões, quermesse com barracas de leilão e outros jogos, além de uma porção de coisas. O moço entregou a carta, depois visitou muitos conhecidos, participou da festa, rezou em louvor a São Luis Gonzaga, e lá pelas tantas resolveu voltar à sua casa. Despediu-se do pessoal, selou o animal e tratou de apressar o trote. De sombração nem se lembrou; ninguém também comentou. Satisfeito de ter feito esse passeio, festejado um pouco, visitado antigos fregueses de seu patrão, ia o rapaz alegre e despreocupado, quando em dado momento, o animal estacou repentinamente, levantou as patas dianteiras, rinchou violentamente, quis virar para traz, mas foi detido por Luis,
que não obstante o susto, soube reagir a tempo freando o cavalo. Quase caiu, mas segurou firme, desceu rapidamente e procurou acalmá-lo. Naquele instante veio-lhe a lembrança do trecho fatídico muito contado pelos viandantes. Um frio correu-lhe na cabeça aos pês; o medo apavorou lhe a mente. Estava na metade do caminho completamente desarmado, não tinha nem um canivete para defender-se.
Passou ali um bom tempo sem saber que faria. Voltar a Vila achava feio e seria covardia; seguir, tinha de enfrentar a assombração e o cavalo recusava andar. Luis Antonio tremia; o suor corria-lhe pelo rosto, bem adiante percebia qualquer coisa esquisita. Depois de muito pensar resolveu enfrentar a situação. Vedou os olhos do animal com seu chapéu, rezando, mas com o coração batendo forte foi andando vagarosamente. Quanto mais se aproximava, mais o calafrio aumentava. Pela cabeça rodava- lhe uma porção de coisas aumentando a confusão, dando a impressão de querer desmaiar.
Invocando a proteção Divina, de Maria Santíssima, é de seu predileto Santo Antonio, foi avançando cautelosamente sem olhar para lado algum. Levou bom tempo, mas conseguiu atravessar o perigo sem nada acontecer. Depois de transposto o perigoso desconhecido parou; respirou profundamente, criou coragem e voltou a olhar para traz. O estranho mistério continuava do mesmo jeito. Nada mais era do que o reflexo do luar refletido na estrada por entre as árvores, que subindo pelo barranco e movimentado por uma leve brisa, representava figuras armadas que impediam todos que ali tentassem passar.
Refeito do susto e do medo, e parecendo ter vencido um grande inimigo, deu uma gargalhada debochando dos valentões de estradas. Depois montou no seu brioso alazão e dando algumas chibatadas, fê-lo voar pela estrada afora até chegar ao seu lar.
2 responses to “A SOMBRA FANTASMA”
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Formidável este velho Chico!!!! 🙂
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