COMÉ QUE É

Crônica de Francisco Piccirillo

“Comé que é”, era apelido de um senhor, com seus cinquenta anos de idade, mas pinguço que quando saía de casa pela manhã, os ombros estavam normais; os braços eretos; as pernas boas, o rosto em forma.
Ele saía, mas já parava no primeiro botequim da esquina e ali tomava seu primeiro aperitivo. Sua familia não se preocupava, sabia que voltava bêbedo, mas voltava, nunca pagou, os outros fregueses pagavam sua conta.

A tendência dele era sempre seguir um rumo acostumado, porisso passava pelo botequim do Manoel Antônio Cipriano e outros e ia terminar sua jornada no bar e mercearia do Álvaro.

Nessa altura já eram mais de onze horas.
Conforme ia andando, passava por lojas, oficinas, barbearias. As pessoas que o conheciam interrogavam com caçoadas:
Comé que é, já tá no regular do meio? Ainda nao, estava subindo a ladeira, nao tinha chegado na mercearia do Alvaro, ponto final, para depois regressar.
As pessoas frequentadoras desses bares, além de não se incomodarem de pagar uma pinga, ainda gostavam de glosá- lo. Nervoso e irritado não era, daí a razão de servirem uma, duas ou mais doses.
Bebia com gosto e até chupava os beiços, mas em compensação seu corpo ia tomando outra forma: seus ombros começavam levantar-se; os braços iam se abrindo; suas bochechas inchando, pela quantidade de álcool já ingerido. Ali pelas treze horas voltava para casa, passo duro parecendo um militar, braços abertos, as pessoas conhecidas brincavam.
— Comé que é, tá no regular do meio?
Não deu confiança. É que nesse dia, ficou no bar do Álvaro mais tempo, já havia bebido o suficiente, mas mesmo assim continuava pedindo e insistia até que um freguês lhe disse.
—- Comé que é, não tá na hora de você voltar para casa? Sua mulher deve estar preocupada.
Ele pensou e respondeu.
—- Tá na hora sim, vou-me embora
—-Vá Com Deus, falou outro freguês.
Nesse interim saiu, mas como havia um degrau meio alto na porta, pisou em falso e saiu cambaleando; virou-se para traz como um furioso e advertiu.
—- Pode acompanhar-me; mas não precisa empurrar.